Este será o primeiro de vários artigos onde estarei explicando os motivos da crise na Venezuela, para os que querem entender como um país "tão rico" chegou nessa situação.
No vídeo abaixo, do pessoal do Meta Ball Studios, é apresentada uma comparação, de uma forma muito ilustrativa e interessante, das reservas de petróleo dos diferentes países. E não percam, no final do vídeo, qual o país com as maiores reservas de petróleo do mundo inteiro! Tal vez vão se surpreender.
O vídeo tem informação de 2017 do U.S. EIA. Tem outros estudos que reportam números onde a Venezuela ainda tem as maiores reservas mas a Arabia Saudita fica um pouco mais próxima, como podem ver no infográfico abaixo que preparei com informação da BP de 2019. (1)
De qualquer forma, o ponto é que não dá para acreditar que um país com tamanha riqueza esteja passando por uma situação tão absurda!
Enquanto a Arábia Saudita tem investido em modernização do país (foto abaixo) na Venezuela as maiores obras de infraestrutura são dos anos 60 (todas feitas na época da "quarta república" tão criticada pelo falecido Hugo Chávez).
Hoje, segundo dados da BP (gráfico abaixo) a Venezuela passou de ser o principal produtor de petróleo cru da América do Sul e Central, a ser o segundo, sendo superado significativamente pelo Brasil (uma diferença de mais de 1000 MBD).
Em 1998, quando o Chávez assumiu o poder, a Venezuela produzia mais de 3100 MBD (Miles de barris por dia) de petróleo cru, segundo dados da EIA (Administração de Informação de Energia dos EEUU) (2).
A indústria contava com uma tecnologia de ponta e profissionais altamente capacitados.
O governo do Chavez experimentou uma insuperável bonança, com o preço do petróleo passando de 20$ por barril em 1998, tendo alcançado um pico de mais de 160$ em 2008. Vivenciou uma queda por conta da crise Internacional e, no ano 2010, voltou aos níveis de 84$ até uma média de aprox 110$ entre 2011 e 2014 (3).
Segundo estudos da Consultora venezuelana Ecoanalítica "Entre 1999 e 2014, a Venezuela recebeu US$ 960,6 bilhões. Uma média de US$56,5 bilhões anuais durante 17 anos" (4).
Sempre que alguém me questiona sobre a riqueza do nosso país, a minha resposta é que somos como o filho do pai rico, que não recebeu uma educação financeira adequada, para entender que o dinheiro não é infinito e que precisa ser administrado de forma correta, pensando nas reservas financeiras para os momentos inesperados.
O Chávez usou a renda petroleira como um talão de cheques pessoal, sem o menor pudor!
Para vocês terem uma ideia do gasto exagerado, o reconhecido economista venezuelano Ricardo Hausmann reporta que em 2012, quando o preço do petróleo venezuelano estava em US$103, o gasto público teve um pênalti de 17% do PIB. "Quer dizer, que a Venezuela gastou como se o petróleo tivesse um preço de US$197 por barril" (5).
Hausmann também reporta que o governo venezuelano usou o período de altos preços do petróleo para sextuplicar a dívida externa pública, passando de 25$ bilhões em 2005 para 150$ bilhões (6).
Qual a resposta do governo aos cálculos do Hausmann? O Maduro fala que ele é "o principal operador do bloqueio e perseguição financeira contra a Venezuela" e ainda fala que "tem que ser perseguido com código vermelho, precisa ser julgado na justiça" (6).
Este economista venezuelano dirige o Centro de Desenvolvimento Internacional da Universidade de Harvard, nos EEUU, foi Ministro de Planejamento da Venezuela durante o governo do presidente Carlos Andrés Pérez e é um crítico de longa data do governo do Hugo Chávez e Nicolás Maduro (6).
Outros economistas, como o Carlos Miguel Alvarez, da Consultora Econanalítica, informam que o Governo aproveitou os ciclos de alta dos preços do petróleo para a emissão de títulos da dívida. Enfrentando compromissos até 2027 por um valor de $ 92 bilhões de dólares. Também denunciam que o Governo chavista destinou grandes somas de dinheiro para ganhar apoio de países da América Latina e do Caribe, vendendo petróleo em condições preferenciais. Como consequência destes financiamentos, existem contas a receber de aprox $148 bilhões de dólares (5).
Também existem dados de endividamento importante com a Russia e a China. Segundo cifras do BID, desde 2007 a China tem emprestado uma soma de $ 65 bilhões, que em parte tem sido pago com envio de carregamentos de petróleo (5).
Hoje a industria está em ruínas. A PDVSA (empresa estatal de petróleo da Venezuela) não consegue produzir mais do que 660 MBD (miles de barris por dia) (7).
Como podem ver, em conclusão, o petróleo, longe de ser a fonte da nossa maior "riqueza", acabou sendo a nossa maior "desgraça". Fazendo uma analogia com a historia da "galinha dos ovos de ouro", o governo mandou embora o responsável por alimentar e cuidar da galinha, saiu dividindo os ovos com os vizinhos e agora está ficando sem comida.
Basicamente, em resumo:
- A economia venezuelana dependia quase exclusivamente dos ingressos da industria petroleira.
- A capacidade produtiva da industria experimentou uma queda dramática devido à demissão de boa parte dos profissionais de carreira da industria petroleira (mais de 40% do total de empregados), que tinham o conhecimento técnico necessário para a operação. Estas demissões aconteceram em consequência de uma importante greve em contra do governo no ano de 2002 (8).
- Não houve um controle do endividamento e o petróleo foi utilizado pelo Presidente Hugo Chávez como moeda de troca para ganhar apoio político na região e no mundo.
- A redução da capacidade da industria, foi ocultada de forma temporária aumentando as importações e o gasto público (5).
- Corrupção generalizada dentro da industria e o governo (9). O Rafael Ramírez, quem foi presidente da estatal PDVSA, entre 2002 e 2013, reconheceu que 30% dos ingressos petroleiros sumiram por conta da "corrupção e o desperdiço".
- Utilização da industria para outros fins diferentes ao negócio central da empresa. A PDVSA acabou financiando e assumindo o controle da distribuição de alimentos, do programa similar ao "bolsa familia" (10).
- Diminuição do investimento para atualização técnica, manutenção preventiva e corretiva (11).